quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Culinária Afro-BrasileiraO negro introduziu na cozinha o leite de coco-da-baía, o azeite de dendê, confirmou a excelência da pimenta malagueta sobre a do reino, deu ao Brasil o feijão preto, o quiabo, ensinou a fazer vatapá, caruru, mungunzá, acarajé, angu e pamonha.

A cozinha negra, pequena mas forte, fez valer os seus temperos, os verdes, a sua maneira de cozinhar. Modificou os pratos portugueses, substituindo ingredientes; fez a mesma coisa com os pratos da terra; e finalmente criou a cozinha brasileira, descobrindo o chuchu com camarão, ensinando a fazer pratos com camarão seco e a usar as panelas de barro e a colher de pau.

Milagre para o governador tomar sopa

O primeiro negro pisou no Brasil com a armada de Martin Afonso. Negros e mulatos (da Guiné e do Cabo Verde) chegaram aqui em 1549, com o Governador Tomé de Souza, que comia mal e era preconceituoso: entre outras coisas, não admitia sopa de cabeça de peixe, em honra a São João Batista.

Bem que o Padre Nóbrega tentou convencê-lo de que era bobagem, mas Tomé de Souza resistiu, até que o jesuíta mandou deitar a rede ao mar e ela veio só cabeça de peixe, bem fresca e o homem deixou a mania, entrou na sopa.

Da guiné vieram, principalmente, fulas e mandingas, islamitas e gente de bem comer. Os fulas eram de cor opaca, o que resultou no termo “negro fulo” (entrando depois na língua a expressão “fulo de raiva”, para indicar a palidez até do branco). Os mandingas também entraram na língua como novo sinônimo para encantamentos e artes mágicas. Mas os iorubanos ou nagôs, os jejes, os tapas e os haussás, todos sudaneses islamitas e da costa oeste também, fizeram mais pela nossa cozinha porque eram mais aceitos como domésticos do que a gente do sul, o povo de Angola, a maioria de língua banto, ou do que os negros cambindas do Congo, ou os minas, ou os do Moçambique, gente mais forte, mais submissa e mais aproveitada para o serviço pesado.

O africano contribuiu com a difusão do inhame, da cana de açúcar e do dendezeiro, do qual se faz o azeite-de-dendê. O leite de coco, de origem polinésia, foi trazido pelos negros, assim como a pimenta malagueta e a galinha de Angola.

Abará

Bolinho de origem afro-brasileira feito com massa de feijão-fradinho temperada com pimenta, sal, cebola e azeite-de-dendê, algumas vezes com camarão seco, inteiro ou moído e misturado à massa, que é embrulhada em folha de bananeira e cozida em água. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Iansã, Obá e Ibeji).

Aberém

Bolinho de origem afro-brasileira, feito de milho ou de arroz moído na pedra, macerado em água, salgado e cozido em folhas de bananeira secas. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Omulu e Oxumaré).

Abrazô

Bolinho da culinária afro-brasileira, feito de farinha de milho ou de mandioca, apimentado, frito em azeite-de-dendê.

Acaçá

Bolinho da culinária afro-brasileira, feito de milho macerado em água fria e depois moído, cozido e envolvido, ainda morno, em folhas verdes de bananeira. (Acompanha o vatapá ou caruru. Preparado com leite de coco e açúcar, é chamada acaçá de leite.) [No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Oxalá, Nanã, Ibeji, Iêmanja e Exu.]

Ado

Doce de origem afro-brasileira feito de milho torrado e moído, misturado com azeite-de-dendê e mel. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Oxum).

Aluá

Bebida refrigerante feita de milho, de arroz ou de casca de abacaxi fermentados com açúcar ou rapadura, usada tradicionalmente como oferenda aos orixás nas festas populares de origem africana.

Quibebe

Prato típico do Nordeste, de origem africana, feito de carne-de-sol ou com charque, refogado e cozido com abóbora.
Tem a consistência de uma papa grossa e pode ser temperado com azeite-de-dendê e cheiro verde.

Culinária Afro-Brasileira

A escravidão deixou marcas indeléveis, em sua grande maioria negativas, na trajetória socioeconômica do Brasil. No que diz respeito ao legado cultural, porém, uma das heranças mais importantes da inserção dos negros na sociedade está na gastronomia.

A influência africana na dieta do brasileiro possui dois aspectos. O primeiro diz respeito ao modo de preparar e temperar os alimentos. O segundo, à introdução de ingredientes na culinária brasileira.

A condição de escravo foi determinante para explicar como a técnica culinária dos africanos desenvolveu-se no Brasil. Tendo sido aprisionados na África e viajado em péssimas condições, os negros não traziam consigo nenhuma bagagem, muito menos ingredientes culinários.

Isso reforçou a necessidade da improvisação para alimentarem-se no novo território, que, por sua vez, tinha uma estrutura ainda pouco eficaz. A própria elite tinha de importar vários gêneros.

Nos engenhos de açúcar, para onde foram levados, as cozinhas eram entregues às negras, pois, no começo, os colonizadores vieram sem suas mulheres. Responsáveis pela alimentação dos senhores brancos e com a necessidade de suprir sua própria demanda, os negros passaram a adaptar seus hábitos culinários aos ingredientes da colônia.

Na falta do inhame, usaram a mandioca; carentes das pimentas africanas, usaram e abusaram do azeite-de-dendê, que já conheciam da África (as primeiras árvores vieram no começo do século 16). Adeptos da caça, incorporaram à sua dieta os animais a que tinham acesso: tatus, lagartos, cutias, capivaras, preás e caranguejos, preparados nas senzalas.

A cozinha africana privilegia os assados em detrimento das frituras. O caldo é um item importante, proveniente do alimento assado ou simplesmente preparado com água e sal. É utilizado na mistura com a farinha obtida de diversos elementos.

No Brasil, essa prática popularizou o pirão _já conhecido pelos índios_, mistura do caldo com farinha de mandioca e o angu (caldo com farinha de milho).
O modo africano de cozinhar e temperar incorporou elementos culinários e pratos típicos portugueses e indígenas, transformando as receitas originais e dando forma à cozinha brasileira.

Da dieta portuguesa vieram, por exemplo, as galinhas e os ovos. Em princípio, eram dados apenas a negros doentes, pois acreditava-se que fossem alimentos revigorantes. Aos poucos, a galinha passou a ser incluída nas receitas afro-brasileiras que nasciam, como o vatapá e o xinxim, e que resistem até hoje, principalmente nos cardápios regionais.

Da dieta indígena, a culinária afro-brasileira incorporou, além da essencial mandioca, frutas e ervas. O prato afro-indígena brasileiro mais famoso é o caruru. Originalmente feito apenas de ervas socadas ao pilão, com o tempo ganhou outros ingredientes, como peixe e legumes cozidos.

O acarajé, hit da cozinha afro-brasileira, mistura feijão-fradinho, azeite-de-dendê, sal, cebola, camarões e pimenta. A popular pamonha de milho, por sua vez, origina-se de um prato africano, o acaçá.

A vinda dos africanos não significou somente a inclusão de formas de preparo e ingredientes na dieta colonial. Representou também a transformação da sua própria culinária. Muitos pratos afro-brasileiros habitam até hoje o continente africano, assim como vários pratos africanos reinventados com o uso de ingredientes do Brasil, como a mandioca, também fizeram o caminho de volta.
No que se refere aos ingredientes africanos que vieram para o Brasil durante a colonização, trazidos pelos traficantes de escravos e comerciantes, esses constituem hoje importantes elementos da cultura brasileira. Seu consumo é popular e sua imagem constitui parcela importante dos ícones do imaginário do país.

Vieram da África, entre outros, o coco, a banana, o café, a pimenta malagueta e o azeite-de-dendê. Sobre este, dizia Camara Cascudo: “O azeite-de-dendê acompanhou o negro como o arroz ao asiático e o doce ao árabe”. No Nordeste, são também populares o inhame, o quiabo, o gengibre, o amendoim, a melancia e o jiló.

Um comentário:

Kandimba disse...
Este comentário foi removido pelo autor.